Há amigos que nos ensinam tanto que o convívio com eles acaba funcionando como verdadeiro curso de pós-graduação. João Paulo Cunha tem sido assim na minha vida. Foi meu colega e chefe no Estado de Minas, em Belo Horizonte, onde até hoje edita o caderno cultural e o de artigos (Pensar). É uma pessoa cuja inteligência e cuja vasta cultura trabalham para o bem comum.
Com formação em Filosofia, Psicologia, Pedagogia e Comunicação Social, João Paulo é mais que jornalista. É um filósofo. E os textos que escreve para o caderno Pensar do Estado de Minas iluminam semanalmente a vida de quem os lê. Por isso, foi surpresa apenas o tempo que levou para que uma seleção deles fosse reunida em livro.
“Em busca do tempo presente” (Comunicação de Fato Editora) reúne cerca de 50 artigos em que todo tipo de assunto se faz presente, mas sempre com um toque de profundidade e poesia. Política, literatura, metafísica, meio ambiente, cinema, histórias de amor e amizade, reflexões que dialogam com grandes pensadores de ontem e de hoje – está tudo ali.
Mais que comentar assuntos, no entanto, João Paulo intervém de forma questionadora e esclarecedora. Ética, para ele, não é assunto teórico, mas desafio diário imposto pelas necessidades profissionais, pelos caminhos como homem e cidadão. Pensar a política e agir politicamente são a mesma coisa. Ser respeitoso, ser íntegro, ser solidário, para ele, significa ser de esquerda, tomar partido, defender o que é justo.
Veja, por exemplo, a crônica “Humanismo em baixa”. Tem tudo a ver com o trabalho que desenvolvemos aqui no MDS. Ele contrapõe humanismo e humanitarismo, mostrando como esse último atua com desprestígio do outro em relação a nós. Para ele, o humanismo deve apontar para a fragilidade dos valores que suportam o humanitarismo: “Sobrevivência como objetivo final não é um dado de civilização, mas uma entrega à barbárie”.
Numa chamada dos jovens a desempenhar seu papel na sociedade, João Paulo critica duramente, em vários momentos do livro, a cultura consumista que domina corações e mentes, esvaziando de sentido a vida daqueles que teriam nas mãos a missão de transformar o mundo, melhorando-o, como outras gerações fizeram em outros tempos. Culto ao corpo, aos modelos de juventude, beleza, magreza, consumo, aparências, vale-tudo – não fica pedra sobre pedra nas suas considerações.
Encerro citando outro trecho de sabedoria, entre os tantos que “Em busca do tempo presente” contém: “O homem comum nos ensina mais sobre a morte que os filósofos e pensadores. A melhor vida é vivida em movimentos estabelecidos pelos valores supremos de fazer o bem, criar os filhos, trabalhar para sobreviver e ser feliz na medida do possível. O homem comum precisa ser um gigante para cumprir tudo isso e deixar como memória um patrimônio de caráter. O homem comum, quando morre, não deixa dinheiro, nem herança de ódios. Costuma deixar tristeza, o sentimento de que algo ainda havia a ser feito. Ele se completa, em sua finitude, na memória daqueles que o amaram”.
(Publiquei este textinho na coluna que mantenho na intranet do MDS, onde trabalho)
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