Nahima Maciel (Correio Braziliense, 9/2/25)
Depois de se debruçar sobre os primeiros livros de Fiódor Dostoiévski em uma série de ensaios publicados no ano passado, a professora e autora Vera Lúcia de Oliveira agora mergulha nos cinco últimos livros do escritor russo. Com Dostoiévski arrebatador, ela traz análises concentradas nos romances Crime e castigo, Os demônios, O idiota, O adolescente e Os irmãos Karamázov, além de apresentar ao leitor Meu marido Dostoiévski, relato revelador escrito pela mulher do autor, Anna Grigorievna. O livro tem lançamento marcado a próxima quarta-feira, no Beirute Sul.
Vera Lúcia releu todos os romances e pesquisou intensamente a vida do escritor russo e a fortuna crítica sobre as obras para escrever os ensaios. “Em Dostoiévski sem moderação, o primeiro livro, o interesse era nas primeiras obras, as que não eram muito famosas. Estava interessada em iniciar os estudos dostoievskianos pelo início dos escritos. Depois avancei, reli as obras primas, mas com um olho muito mais crítico, observador, querendo ver coisas importantes que pudesse transmitir”, explica.
Além de análises que trazem para o universo do russo autores como Gabriel Garcia Márquez e Graciliano Ramos, Vera Lúcia também faz uso de uma perspectiva psicanalítica, área na qual tem formação, para destrinchar os romances. O mito de Napoleão, por exemplo, é utilizado para evidenciar certos aspectos de Crime e castigo e de seu protagonista, o estudante Raskólnikov. “Fico muito comovida com o sofrimento e a pobreza do Raskólnikov, e fui ver que ele foi movido por uma ideia obsessiva, ele queria ser igual a Napoleão. Então começo meu texto dizendo isso, o que motivou o crime foi a ideia de ser Napoleão, ele queria ser um homem superior a quem tudo seria permitido, inclusive, matar. É algo para a gente refletir”, sugere Vera Lúcia.
Esse foi um dos poucos romances de Dostoiévski cujo sucesso foi imediato logo após a publicação, em 1866. Em O idiota, a pesquisadora se deparou com semelhanças desconcertantes entre o príncipe Michkin e o próprio autor. “O príncipe era epiléptico e Dostoiévski também. Sofreu muitos ataques e ficava totalmente debilitado. E o príncipe é de uma bondade enorme, parece um Jesus Cristo. Perdoa a tudo e a todos. É a ideia de um idiota mal compreendido. O livro fracassou no momento em que foi editado e foi publicado com muita dificuldade. É uma história muito comovente de um rapaz de uma bondade sem limites e também doente”, aponta Vera Lúcia.
Os demônios, segundo a autora, é o livro mais político do russo. “Ele critica veementemente um movimento de jovens populistas que surgiu na Rússia nos anos 1870. Eram jovens burgueses que queriam olhar pelo povo, mas que se tornaram revolucionários e assassinos. Ele foi criticadíssimo”, conta a autora. Por fim, ela estudou O adolescente, em que o autor reflete sobre a paternidade por meio do personagem Arcade, jovem sem pai, situação que também marca Os irmãos Karamazov. “Essa questão da paternidade é forte em Dostoiévski. O pai dele foi assassinado quando ele tinha 18 anos. Para Freud, o primeiro grande ataque epilético dele foi na ocasião da morte do pai, assassinado por três servos. Ele pode ter passado a vida inteira remoendo a morte do pai, que era muito autoritário, e essa história pessoal está muito entranhada nos romances dele”, garante Vera Lúcia.
Dostoiévski arrebatador
De Vera Lúcia de Oliveira. Outubro edições, 144 páginas.
R$ 60. Lançamento, às 19h, no Beirute Asa Sul
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