Sextou (sempre quis usar essa expressão mas nunca havia conseguido)! O expresso pão de queijo é um tipo de transporte “alternativo” usado por pessoas que trabalham em Brasília e vão a Belo Horizonte visitar a família no fim de semana.

Quando entrei no ônibus, fiquei sabendo que dois motoristas nos conduziriam por aquela viagem: chamemo-los Juba e Lula.

Juba dirigiu-se aos passageiros pedindo que, se fôssemos parados pela fiscalização, disséssemos que havíamos comprado passagens de ida e volta. Era para mentir falando a verdade. Concluiu afirmando que o problema era a ANTT, que não quer deixá-los trabalhar. Anotem esse comentário, ele vai fazer sentido mais adiante.

A primeira hora e meia de viagem transcorreu sem intercorrências. Paramos para jantar e seguimos em frente. Na parada deu para ver que éramos pelo menos seis ônibus nas mesmas condições. Uns com grife, outros nem tanto.

Mais duas horas e meia de estrada e a coisa desandou. Estava quase dormindo quando percebi que havíamos parado no acostamento. Pensei que iríamos ajudar alguém em apuros. Ledo engano. Eis que Juba novamente entra na cabine para nos avisar que o compressor de ar havia “torado”.

– Trocamos ontem. Quebrou. E o velho ainda funcionava!

Juba e Lula estavam perplexos porque não sabiam o que fazer. Ali, ao lado de um posto de pedágio, não pegava sinal de celular. Ninguém conseguia contato. Tentaram enviar mensagem de voz para alguém em Brasília pedindo para mandar o mecânico com o compressor antigo, mas a mensagem não saía de Paracatu. Logo que paramos chegou um ônibus e acolheu cinco dos nossos passageiros. Sobramos 13. Os cinco ou seis ônibus seguintes não tinham lugar para nós. Ficando cada vez mais sem opção, percebi o diálogo dos dois:

– Um de nós deveria pegar carona até um posto para conseguir ligar para alguém. Você vai?

– Posso ir. Você não quer ir?

– Tanto faz.

Estava cada vez mais claro que eles não tinham nenhum plano, nem A nem B. Claramente não eram acostumados a pensar antes de fazer alguma coisa. Nunca lhes ocorreu que precisariam saber o que fazer nessa situação? Pelo jeito, não.

Uma sorte que demos foi que o grupo que esperava em pé ao relento por volta da meia-noite não se deixava abater pelo mau humor. Um homem carregando um terno se preocupava, pois precisava chegar a Belo Horizonte a tempo do casamento.

– Você é o noivo?, perguntei.

– Não, não tenho mais idade pra casar.

– Ainda bem! Só quem não pode se atrasar é o noivo.

Rimos todos.

Passou um ônibus da Saritur vindo de Goiânia com apenas três passageiros. Parados por Lula, se recusaram a receber nosso pessoal. Uma mulher declarou que foi contratada para levar três pessoas, por isso não carregaria mais ninguém.

Ficamos todos indignados. Daí a pouco foi a vez de uma das nossas companheiras reclamar que a empresa gestora da rodovia até aquela hora não havia enviado um carro de socorro.

– E a gente pagando imposto!

Chegamos ao segundo ponto da nossa história. Se na primeira parte percebemos como faz falta o hábito de pensar, de planejar, de raciocinar, aqui fica clara a falta de contato das pessoas com a realidade.

Sem a ANTT, tão criticada por Juba e que serve para fiscalizar o transporte, ficamos na situação em que ficamos. Nosso contrato ali com o expresso pão de queijo não tem nenhuma valia. Quem arbitra as nossas relações? Assegura uma boa revisão desses carros que transitam pelas noites das nossas estradas?

E sobre o comentário da moça a respeito dos impostos, não se tratava de imposto nenhum, mas de uma rodovia privatizada, que recolhe pedágios sem miséria e não devolve em serviços o que recebe em dinheiro.

Defendem a torto e a direita a privatização, que em tese melhoraria a qualidade do serviço, mas ninguém fiscaliza, ninguém controla, ninguém presta o serviço a que se candidatou.

Chegamos ao terceiro e último ponto da nossa história. Se finalmente fomos acolhidos por um ônibus de linha que nos trouxe sãos e salvos até a rodoviária de BH, não passou despercebida a falta de humanidade da turma da Saritur. Mas somos bem informadas. Lembramos muito bem de onde uma turma que se sente elite ia na calada da noite receber de uma estelionatária doses falsificadas de vacina contra a covid para furar a fila das prioridades. Era na garagem da Saritur.

No Brasil, a canalhice tem nome, sobrenome, endereço, CNPJ e logomarca no painel.