Já havia resenhado aqui o forte livro de contos As coisas que perdemos no fogo, de Mariana Enriquez, o que acabou me levando a ler outro livro dela, Este é o mar (Intrínseca). Jornalista argentina de uma geração posterior à minha, Mariana Enriquez trata com igual vigor temas bem diferentes. Se os contos falavam de uma Argentina contemporânea marcada pelos graves problemas sociais, indigência e falta de perspectivas pessoais e políticas, neste romance a escritora adentra um campo mais universal. E para tal escolhe um gênero que já foi o forte na literatura do continente.
O tema em questão é a construção e derrubada dos mitos da cultura pop. O gênero, o fantástico. A trama gira em torno de figuras femininas mitológicas cuja missão é erguer e dominar ídolos do rock. Ao mesmo tempo, conduzir à loucura e à morte legiões de fãs ensandecidas pelo amor e pela atenção de seus ídolos. Essas mulheres, entre sereias e bruxas, estão há séculos por aí cumprindo tal sina. Seriam elas a acenar com a fama e a fortuna, com o prazer e o gozo, com sexo, drogas e aplausos, até que, mordida a isca, vem o preço a pagar.
A escrita de Mariana tem todas qualidades para seduzir e encantar, tal como suas sereias traiçoeiras, o leitor brasileiro. Sem a contraindicação da danação eterna. Afinal, boa literatura nos alimenta e enriquece, e nunca conduz à desgraça. Precisamos ler mais mulheres, precisamos ler mais latino-americanas.
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