Quando comecei a vir a Brasília, nos anos 1970, para passar férias na casa de meus tios, os primeiros aspectos que me chamaram a atenção foram a amplitude do espaço e o vazio de gente nele. Naquela época, a cidade era realmente bem mais vazia, com amplos gramados, quadras e ruas em que não se via ninguém. Meu primo, então estudante na UnB, dizia que isto era o que mais o incomodava: “Posso passar as primeiras horas do dia sem ver vivalma”, dizia. “Saio de casa, desço de elevador para a garagem, entro no carro, atravesso a cidade, paro no estacionamento e só vou cruzar com um ser humano nos corredores da faculdade.”
Hoje, com o crescimento da população, Brasília já oferece “serviços” característicos de qualquer metrópole, como engarrafamento, seqüestro-relâmpago, violência de todo tipo. Mesmo assim, o Plano Piloto ainda é uma ilha de paz e beleza cercada por cidades de altos níveis de criminalidade, baixos índices de qualidade de vida e urbanização, muita pobreza.
E só agora, com quase três anos na cidade, me caiu a ficha sobre a ruindade dos serviços de transporte urbano. É uma forma ? eficaz, sem dúvida ? de manter a pobreza distante do centro. Como fica difícil a circulação, não se vêem, em Brasília, tantos pedintes, trombadinhas e artistas de sinal quanto em qualquer outra capital ou cidade grande. Não que eles não existam, mas como freqüentar a cidade se não há volta fácil, se os ônibus levam horas para passar, são poucos e raros?
O confinamento dos pobres nos guetos em torno do monumento artístico e arquitetônico não elimina a criminalidade, mesmo porque crimes são cometidos por gente de qualquer segmento social, mas isola as diferenças extremas. Com a ajuda do desenho urbano e das políticas excludentes, a estratificação da sociedade, em Brasília, varre os contrastes para debaixo do tapete.
A inspiração democrática e socialista de seus idealizadores não foi suficiente para concretizar, no sonho do Planalto Central, um espaço plural de convívio entre diferentes. Pelo contrário, originou uma sociedade de castas isoladas, não por grades e muros, mas pela amplidão e o difícil acesso. Que tende a se acentuar, caso não haja propostas de descentralização e inclusão, como as defendidas pelo novo secretário de Cultura do DF, José Silvestre Gorgulho, em entrevista, ontem, ao Correio. Que ele seja feliz em seu intento!

publicado no Correio Braziliense em 13/01/07

1 thoughts on “Hora de incluir

  1. Clarice says:

    ei, clara!
    passei uns tempos de correria louca e até me assustei de ver o tanto de tempo que tinha que eu não vinha no blog! ótimas dicas, vontade de correr pro cinema (com um livro na bolsa pra ler na fila, ehehehe)! mas queria dizer mesmo é adorei ver textos do correio também aqui. 🙂
    bjão!

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