Já sou fã de Marcos Bagno desde que li dele o Preconceito Linguístico. Para ele, muito do que os puristas consideram erros não passa de preconceito contra o linguajar do povo. A língua é mais um instrumento de dominação, e como tal serve às elites e à submissão dos “incultos” por meio da desvalorização da fala popular.
Seu novo trabalho, Falsas Elegâncias – como evitar a hipercorreção na escrita formal (Parábola), trata de um tipo de erro cada vez mais comum: na busca de escrever certo, mas sem saber como, muita gente comete erros e deselegâncias, quando a simplicidade seria – sempre é – a melhor solução.
Ele aborda vícios e muletas comuns, como o emprego do verbo “possuir” em lugar do mais comum, “ter”, em alguns casos de forma completamente inapropriada. Por exemplo: “João possui três filhos”. Além de não se tratar de posse, a acepção do verbo no sentido de conjunção carnal permite um erro grave de interpretação. O ideal, nesse caso, é o bom e velho “João tem três filhos”. Me lembrei de imediato dos locutores de futebol que dizem “o lateral pertence ao Atlético”, em vez do óbvio “o lateral é do Atlético”, uma vez que ali não é o caso de possuir, de pertencimento.
São inúmeros casos apontados por Marcos Bagno no livro: o emprego indiscriminado de “onde”, a falsa diferenciação entre “onde” e “aonde”, o recurso errôneo a “o qual”, “o mesmo”, “o quão” e diversos outros que vemos por aí. Além dos mais, ele desmitifica o que usualmente é considerado erro, como iniciar a frase com o pronome oblíquo (como fiz acima, em “Me lembrei”), hoje ampla e alegremente aceito. Assim como esse, vários falsos erros são apontados, lembrando o autor que alguns já estão absorvidos na língua portuguesa há mais de 500 anos.
Neste novo livro, o linguista e doutor em filologia (mineiro de Cataguases, terra de gênios!) dá uma aula leve e importante, sobretudo para quem lida profissionalmente com a língua, caso de revisores, escritores, editores, professores. Recomendo fortemente sua leitura, assim como a de Preconceito Linguístico, instrumentos que nos ajudam a abrir a cabeça e entender melhor nosso idioma em constante transformação. A língua é viva, viva a língua portuguesa!
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