Dois anos depois do primeiro volume da trilogia O Lugar Mais Sombrio, Milton Hatoum lançou o segundo, Pontos de Fuga (Companhia das Letras), continuando a história de Martim, o jovem que ficou com o pai após a separação do casal e veio parar em Brasília, nos anos setenta, primeiros tempos de luta estudantil contra a ditadura. Agora Martim voltou pra São Paulo, afastou-se da agressiva presença paterna e segue à procura da mãe, que não vê desde que foi embora do Centro-Oeste.
O novo romance alterna a narrativa de Martim em São Paulo, logo após ter saído de Brasília, e do protagonista em Paris, na época da anistia, quando boa parte dos exilados, alguns em atividade no movimento internacional, outros tentando sobreviver como dava, começa a cogitar a volta ao país. Ainda mais angustiante que o primeiro volume, neste Hatoum dá voz a outras personagens, como o Nortista, ator e militante amigo de Martim desde o teatro na jovem capital, a ex-namorada Dinah, figura fugaz que entra e sai de sua vida para acentuar suas incertezas, a turma da república onde ele morou na rua Fidalga, a avó, no litoral, e outros tipos mais ou menos estranhos, como Damião, um artista de circo que caça e mata pombos pra vender (como comida).
As bebedeiras e as perambulações de Martim em busca da mãe, que supõe desaparecida pelos mesmos motivos de perseguição política que determinam a movimentação de quase todas as personagens, expõem a desagregação emocional do jovem, cada vez mais perdido com relação a trabalho, arte, relações afetivas, saídas pra sua vida. Se há um lugar mais sombrio do qual falar, sem dúvida é o tempo-espaço desses meados de anos setenta para uma geração, não só no Brasil como em toda a América Latina, que se viu perdida sob o tacão das ditaduras e amordaçada pela falta de esperança e de perspectiva.
Milton Hatoum nos conduz nessa narrativa fragmentada por vozes múltiplas que têm, no uníssono, esta única afinidade: a angústia. Os pontos de fuga, nesse caso, são precisamente rotas por onde cada um foge, ao seu jeito, pra lugar nenhum, pois naquele momento, de fato, não há saída.
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