Porque hoje é domingo, dia de poesia. Porque é aniversário da Glória Maria Arreguy Maia, minha irmã mais velha. E porque a memória me pede.
Seis anos atrás, eu tinha acabado de terminar uma relação longa e feliz e estava triste e me sentindo sozinha. Como costumava fazer nos meus tempos iniciais de Brasília, quando me sentia triste e sozinha, corri pro shopping, pra me esconder no cinema. Era a primeira sessão, tipo uma da tarde. Não tinha quase ninguém ainda por ali. Na fila só havia um homem baixinho na minha frente, esperando a bilheteria abrir. Enquanto não abria, ele virou pra trás e me perguntou algo sobre o horário. Era o Paulo Betti. Levei aquele susto gostoso, mas respondi sem dar bandeira.
Compramos nossos ingressos e fomos nos dirigindo pra praça de alimentação, pra comer algo antes do filme. Parei no restaurante que eu já conhecia. Ele olhou algumas opções e acabou vindo atrás de mim. Novamente me perguntou algo sobre a comida, eu respondi que ali era bom, podia ir sem medo.
Sentei numa mesa sozinha com minha bandeja. Mais uma vez ele veio atrás e me perguntou se podia sentar comigo. Claro, será um prazer. Estávamos almoçando e papeando calmamente quando começou a chegar gente e interromper pra pedir autógrafo e selfie. Ele, com toda paciência, parava de comer pra atender aos fãs. Eu morria de vergonha alheia. Será que não se tocam que a comida vai esfriar?
Por essas e por outras, não tive coragem de pedir autógrafo nem de fazer selfie com ele. Ele estava em cartaz na cidade com o monólogo Autobiografia Autorizada. Contei que havia feito teatro e havia sido crítica de teatro por 18 anos, mas que não era mais. Era escritora. Lhe dei um livro meu, ele pediu autógrafo. Me convidou pra ir vê-lo, que aquele era o último dia da peça. Que passasse depois no camarim pra dizer o que havia achado.
Eu já não ia ao teatro havia um bom tempo. Mas, naquele domingo, fui. A peça era ótima. O ator, maravilhoso. A pessoa, que eu já admirava pelo posicionamento político aguerrido, se tornara um “amigo de infância”, alguém que me fez companhia e se deu pra mim, de alguma forma, num momento de dor. Não fui ao camarim. Mandei só uma mensagem escrita.
Depois que me mudei pra Brasília deixei pra trás um velho amor, o teatro. Fui aprendendo com a vida a deixar pra trás amores e dores, a acumular perdas e ganhos, a seguir adiante. Grata por tudo que me trouxe até aqui.
Bom domingo a todos!
Posts recomendadosVer Todos
A descoberta do Brasil e outros deslocamentos
Delicada e forte carpintaria literária
Diferentes emoções numa impressionante coleção de contos
Silêncio! Precisamos ouvir o canto da iara
Nas alturas escarpadas da estética
Falta de pensamento e de contato com a realidade, e a canalhice de sempre